“Exigência de dano efetivo ao erário vale para casos anteriores à reforma da Lei de Improbidade”

Exigência de dano efetivo ao erário vale para casos anteriores à reforma da Lei de Improbidade

A Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a comprovação de prejuízo efetivo ao erário, como condição para a condenação baseada no artigo 10 da Lei de Improbidade Administrativa, deve ser exigida nos processos relativos a fatos anteriores à Lei 14.230/2021 que ainda estejam em andamento. Na decisão, tomada por unanimidade, o colegiado reforçou o entendimento de que a condenação com base no artigo 10 (atos de improbidade que causam prejuízo ao erário) não pode mais ser aplicada com fundamento na presunção de lesão aos cofres públicos.

Na origem do processo julgado pela turma, o Ministério Público do Tocantins (MPTO) ajuizou ação de improbidade contra dois agentes públicos estaduais devido a contratações irregulares realizadas mediante inexigibilidade de licitação. Essas contratações, no valor de R$ 2,2 milhões, eram relacionadas à execução do projeto Agora Tocantins.

Em primeira instância, os acusados foram condenados com base no artigo 10, incisos VIII e XI, da Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/1992), ainda sem as modificações trazidas pela Lei 14.230/2021. As penas incluíam perda dos valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos, pagamento de multa civil equivalente ao valor do dano e proibição de contratar com o poder público.

No entanto, o Tribunal de Justiça do Tocantins (TJTO) afastou a condenação por entender que não houve efetiva demonstração de prejuízo ao erário, uma vez que não havia evidências de que o valor contratado estava acima do normal.

Ao STJ, o Ministério Público pediu o restabelecimento das sanções aplicadas em primeiro grau, sob o argumento de que a dispensa indevida de licitação ou a declaração indevida de sua inexigibilidade justificariam a condenação por ato de improbidade com base no artigo 10, em razão do dano presumido.

Não há como reconhecer ato ímprobo sem o efetivo dano ao erário

O relator do recurso, ministro Gurgel de Faria, explicou que, antes das mudanças trazidas pela Lei 14.230/2021, o STJ entendia que a dispensa indevida de licitação configurava improbidade, em razão do prejuízo presumido aos cofres do estado. Contudo, com a reforma legislativa e a nova redação dada ao artigo 10, tornou-se necessário comprovar a perda patrimonial efetiva para haver condenação por improbidade.

No entendimento do ministro, essa exigência de comprovação do dano deve prevalecer também nos casos anteriores à mudança da lei que ainda estejam em tramitação na Justiça. “Sem o dano efetivo, não há como reconhecer o ato ímprobo”, declarou.

Gurgel de Faria ressaltou que a situação em análise não se enquadra na limitação prevista pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento do Tema 1.199 da repercussão geral. Segundo ele, não se trata de aplicação retroativa de alteração normativa benéfica ao réu, já que, anteriormente, não havia norma expressa prevendo a possibilidade do dano presumido – o que só foi admitido em razão da jurisprudência consolidada do STJ.

Ao negar provimento ao recurso do Ministério Público, o relator afirmou que o entendimento jurisprudencial anterior não pode seguir orientando as decisões do tribunal quando a legislação estabelece expressamente não ser cabível a condenação por ato ímprobo com fundamento em dano presumido.

“Cabe ao Judiciário prestar a devida deferência à opção que seguramente foi a escolhida pelo legislador ordinário para dirimir essa questão”, concluiu o ministro.

REsp 1.929.685.

Veja a matéria completa em: https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/2024/04092024-Exigencia-de-dano-efetivo-ao-erario-vale-para-casos-anteriores-a-reforma-da-Lei-de-Improbidade-.aspx#:~:text=%E2%80%8BA%20Primeira%20Turma%20do,que%20ainda%20estejam%20em%20andamento

“Absolvição criminal por atipicidade não vincula ação de improbidade”

Absolvição criminal por atipicidade não vincula ação de improbidade

 

As sentenças civis e penais produzirão efeitos sobre a ação de improbidade administrativa quando concluírem pela inexistência da conduta ou pela negativa da autoria, mas não quando for o caso de atipicidade da conduta.

Com esse entendimento, a 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça negou provimento ao recurso especial de Carlos Alberto Pereira, ex-prefeito de Lavras (MG), condenado por improbidade.

Segundo a denúncia, ele participou de um esquema para desviar verbas da Secretaria Municipal de Saúde em proveito próprio. O dinheiro seria repassado ao Instituto de Previdência Municipal.

O ex-prefeito respondeu a ação penal pelos mesmos fatos, na qual acabou absolvido por atipicidade da conduta — ou seja, o ato do qual foi acusado não corresponde ao tipo penal definido por lei.

O juízo criminal concluiu que não houve dolo específico do réu. A defesa, então, pediu que essa conclusão exercesse influência na seara administrativa, para levar à improcedência da ação por improbidade. As instâncias ordinárias, porém, negaram o pedido.

Condenação mantida

Relator da matéria no STJ, o ministro Herman Benjamin manteve essa conclusão. Ele apontou a jurisprudência da corte no sentido de que a absolvição criminal só influi na área cível se a conclusão foi de que não se comprovou a conduta ou a autoria. Essa é inclusive a previsão da Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.249/1992), no artigo 20, parágrafo 3º.

Já o artigo 21, parágrafo 4º, da mesma lei, que diz que “a absolvição criminal em ação que discuta os mesmos fatos, confirmada por decisão colegiada, impede o trâmite da ação da qual trata esta lei”, está suspenso pelo Supremo Tribunal Federal. A sua constitucionalidade ainda está sob análise.

“O entendimento jurisprudencial aplicado pela origem, inclusive, está em acordo com o disposto no artigo 20, parágrafo 3º, da Lei 8.249/1992 (na redação da Lei 14.230/2021), no sentido de que as ‘sentenças civis e penais produzirão efeitos em relação à ação de improbidade quando concluírem pela inexistência da conduta ou pela negativa da autoria’”, disse o relator.

REsp 1.991.470

 

Veja a matéria completa em: https://www.conjur.com.br/2024-jul-23/absolvicao-criminal-por-atipicidade-nao-vincula-acao-de-improbidade-diz-stj/

 

 

“Empate real em licitação impõe sorteio com todas as empresas, diz TJ-SP”

Havendo empate real entre as propostas apresentadas, a comissão de licitação deverá definir o vencedor por meio de um sorteio do qual participarão todas as empresas que figuraram no pregão.

Com esse entendimento, a 2ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo negou provimento ao recurso interposto por uma empresa administradora de cartões e manteve o resultado de uma licitação promovida pela Prefeitura de Iperó (SP).

Feita por meio de pregão eletrônico, a licitação buscava contratar uma empresa para a administração e fornecimento de vale alimentação aos servidores municipais.

A administradora e outras duas empresas entraram na disputa na condição de beneficiárias da Lei Complementar nº 123. Promulgada em 2006, a lei estabelece que, nas licitações, o poder público deve dar prioridade às microempresas (MEs) e empresas de pequeno porte (EPPs) como critério de desempate.

Nesse sentido, a norma considera que há empate em um pregão nas situações em que as propostas apresentadas pelas MEs e EPPs sejam até 5% superiores à proposta mais bem classificada. Nesse cenário — chamado de “empate ficto” —, a ME ou EPP mais bem colocada poderá apresentar proposta de preço inferior àquela de melhor valor, desempatando o certame a seu favor.

No caso dos autos, contudo, todas as empresas participantes da licitação ofertaram o mesmo valor: R$ 7,9 milhões. Diante do empate (real, no caso, e não ficto), a prefeitura resolveu a questão fazendo um sorteio do qual participaram todas as empresas. A vencedora foi uma das credenciadas com base na LC 123/2006.

Desclassificada do certame, a administradora de cartões entrou com um mandado de segurança alegando que a prioridade para microempresas e EPPs não foi observada pela comissão de licitação — que, por sua vez, informou que a regra de preferência não se aplica na hipótese de empate real.

Por fim, a administradora argumentou que a sorteada não se enquadrava nas categorias de empresas com prioridade.

O juízo de primeira instância indeferiu a liminar e manteve o andamento do pregão. A administradora entrou, então, com agravo de instrumento.

Aniquilar a concorrência

Relatora do agravo, a desembargadora Maria Fernanda de Toledo Rodovalho disse não ter encontrado a irregularidade apontada.

Ela explicou que, para além da LC 123, a própria Constituição, em seu artigo 179, prevê o tratamento diferenciado às microempresas e às empresas de pequeno porte como forma de viabilizá-las no mercado. Na mesma linha, a Lei nº 8.666/1993 dispõe que as normas de licitações devem privilegiar as MEs e EPPs. Também o edital da licitação promovida pelo município paulista observou o direito de prioridade no desempate, conforme prevê a LC 123.

Ocorre que, no caso em análise, as propostas apresentadas pelas empresas eram idênticas. E isso, segundo a relatora, leva à constatação de que não se estava mesmo diante de “empate ficto”, mas de um empate real entre todas as licitantes.

A desembargadora destacou que, após o empate, a comissão licitante concedeu a oportunidade para que as empresas classificadas como ME ou EPP encaminhassem nova oferta, “mas elas permaneceram inertes”.

Na sequência, a comissão apurou se havia preferência entre as empresas segundo a Lei 8.666/1993, que estabelece como critérios a produção de bens no Brasil, por empresas nacionais; o investimento em pesquisa e desenvolvimento de tecnologia no país; e a reserva de cargos para pessoa com deficiência. Ainda assim, o empate foi mantido.

Nessa situação, o edital previa que o vencedor seria definido em um sorteio feito por sistema eletrônico entre as propostas empatadas. Na visão da EPP autora do agravo, porém, a comissão deveria ter limitado o sorteio somente às microempresas e às empresas de pequeno porte, tanto na hipótese de empate ficto quanto na de empate real. Para a relatora, tal entendimento é equivocado.

Isso porque o tratamento pedido pela administradora se refere à oportunidade de apresentar nova proposta em caso de empate ficto. “O empate real não torna possível a aplicação dessa lógica”, explicou a desembargadora. Com isso, “a vontade da empresa de aniquilar parte da concorrência, para que o sorteio, neste caso, aconteça tão somente entre as microempresas e empresas de pequeno porte ofende o
princípio da legalidade, vinculação ao edital, isonomia e contratação mais vantajosa.”

Citando tese do autor Laércio Loureiro, especialista na Lei de Licitações, a relatora destacou que “em nenhum momento” a LC 123 estabelece uma preferência com base na simples razão de uma empresa ser ME ou EPP “em detrimento da vantajosidade a ser buscada pela administração pública”. Diante disso, no caso de empate real, o sorteio entre todas as empresas é a solução.

Por fim, ela rejeitou o argumento de que a sorteada não poderia participar da licitação como beneficiária da LC 123, já que a receita bruta da empresa está dentro do limite previsto para EPPs na lei.

A votação foi unânime. Participaram do julgamento os desembargadores Claudio Augusto Pedrassi (presidente), Renato Delbianco e Marcelo Berthe.

Agravo de Instrumento 2338418-94.2023.8.26.0000

Veja a matéria completa em: https://www.conjur.com.br/2024-mar-22/empate-real-em-licitacao-impoe-sorteio-com-todas-as-empresas-diz-tj-sp/